domingo, 11 de abril de 2010
DEBATE - CHUVAS E QUESTÃO SOCIAL
Caros blog-leitores, compartilhamos com vocês alguns artigos que propõem uma reflexão sobre os acontecimentos sociais e urbanos trágicos dos últimos dias, parte importante também do que Ana Lúcia Vaz chamou de “Olhar em Rede”. Agradecemos a todos os amigos e colaboradores que gentilmente os enviaram. Nunca é demais, porém, aproveitando a inspiração musical de Jorge Ben e o mote da matéria abaixo, fazermos “uma prece para a chuva parar”. Todavia, as análises que se seguem vão, de fato, mostrar que a complexidade do problema é resultado de algo bem maior que os caprichos de uma “ chuva ruim”, contra quem contestava o poeta, deixando no Rio de Janeiro e em Niterói um rastro de calamidade pública.
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A culpa é de São Pedro e dos cariocas
Afonso Costa*
JORNALISTA
Mais uma vez as esporádicas chuvas torrenciais foram as responsáveis pelo caos que se instalou no Rio de Janeiro. Além delas, a falta de educação dos cariocas e a falta de responsabilidade daqueles que morreram e perderam suas famílias por morarem nas encostas. Essa é a avaliação nas entrelinhas das entrevistas concedidas pelo prefeito e sua equipe desde a noite de segunda-feira, dia 5.
Em verdade, a chuva torrencial explica mas não justifica: Cadê a prefeitura? Está cuidando do coco na praia? Do limãozinho? Dos camelôs? Está fazendo choque de ordem? A ordem das águas? Do caos?
Os ralos não são limpos há muito tempo e todo mundo vê, ou melhor, não vê. Ao mesmo tempo, é inequívoco que a prioridade da prefeitura desde que assumiu não foi a conservação da cidade. Ao contrário, tem sido atrapalhar a vida dos cariocas em todas as áreas: na praia, no trabalho, na rua, no estacionamento, no maracanã... .
Em artigo publicado há cerca de três meses escrevi que “é muita falta de sensibilidade (da prefeitura) pretender promover ordem, quando o que a cidade mais precisa é de investimentos e prioridade nos serviços voltados diretamente à população mais carente”.
Infelizmente, palavras proféticas. A arrogância do executivo municipal permitiu que o caos se instalasse na cidade, que vidas tenham sido perdidas.
A arrogância se traduz em um trecho de entrevista concedida pelo prefeito: "Vai ver que é normal o que acontece na cidade, que essa chuva é assim mesmo, tem toda semana e, por acaso, nas outras vezes, limpei os ralos e hoje eu resolvi não limpar."
Não limpou! Da mesma maneira, não trabalhou na infra-estrutura da cidade, não foi capaz de fazer a conservação, quiçá investimentos prioritários, principalmente nas regiões em que mora a população mais carente, que só serve para lhe dar votos, é o que tudo deixa a transparecer.
Em um raro momento de clareza, o prefeito alegou que “É claro que ninguém nega que existam deficiências e problemas estruturais, mas não há galeria pluvial limpa que segure este volume de água".
Existe, desde que cuidada com o esmero que foi desferido contra os cariocas, e não a seu favor. Existe desde que se transforme em prioridade da prefeitura, o que até hoje não ocorreu.
A prefeitura se ausentou de instaurar políticas públicas sérias, voltadas para o benefício da população. Pois está mais do que na hora de fazer auto-crítica, redirecionar a administração municipal e assumir um governo voltado para todos, em especial a população mais carente, que já sofre com a especulação imobiliária, os baixos salários, o transporte insuficiente.
Lamentavelmente o governador Sérgio Cabral segue a mesma linha – não é a troco de nada que são aliados. Atribuiu aos moradores das encostas a culpa pela própria morte. Sequer citou quaisquer políticas públicas como alternativa. Aliás, citou: uma reedição do muro erguido em Israel contra os palestinos.
Para ele, os moradores moram nas encostas por que querem, por desleixo e “disciplina” é a solução.
Quando governador e prefeito resolverem governar para a população e não apenas para os ricos, talvez isso mude de figura, mas para tanto precisamos fazer a nossa parte: exigir e pressionar executivos que não representam nossas necessidades.
O Rio de Janeiro não agüenta mais tanta incompetência, tanta inoperância.
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* Artigo enviado, em 08/04/2010, pelo professor e amigo, Marcelo Braz, via rede do PCB/Partido Comunista Brasileiro.
Para escutar
http://www.youtube.com/watch?v=GemqUlXe1Jw
[“Chove chuva”, com Miriam Makeba]
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