terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Editoria Caleidoscópio Baiano

Mudança do Garcia”: na contramão do carnaval oficial
Especial de Carnaval Salvador 2010

Claudia Correia

O tradicional desfile da “Mudança do Garcia’ sai toda segunda-feira no carnaval de Salvador há 80 anos. Não há cordas, trio elétrico ou seguranças. O percurso vai do fim de linha do bairro do Garcia ao Campo Grande, no início do circuito oficial da folia. Nos moldes do carnaval baiano, não podemos chamá-lo de “bloco”. Ninguém paga para sair, nem tem abadá vendido a preço de ouro por empresários e cambistas.

É um grande cortejo formado por carroças com jegues e cavalos, batucadas, veículos enfeitados, foliões fantasiados, e grupos animados. Para o jornalista André Santana “é um espaço de preservação da liberdade e democracia da folia momesca. A irreverência ganha contornos políticos, graças aos cartazes e faixas de protestos que acompanham o desfile”.

Com o tempo, a Mudança virou o principal palco para o movimento social no Carnaval baiano. Sindicatos, partidos de oposição e o movimento negro aproveitam a festa para divulgar suas bandeiras de luta. Claro que em ano eleitoral, os candidatos pegam uma carona no cortejo para distribuir abraços e sair na mídia. Este ano os Conselhos Regional de Serviço Social e de Psicologia aproveitam o desfile para levar às ruas o seu repúdio à lei que regulamenta o “ato médico” e discrimina a atuação dos demais profissionais da equipe interdisciplinar de saúde.As mulheres levam a campanha contra a violência para cima de um pequeno trio elétrico improvisado e combinam política com alegria.

A Mudança não ganha muito espaço na mídia local, exceto na TV Educativa que cobre o desfile. Os organizadores do Carnaval criam polêmica todo ano com a Mudança , que acaba quebrando o protocolo oficial com uma presença espontânea e irreverente. As emissoras que cobrem o Carnaval de Salvador não mostram com destaque o desfile escrachado e alegre da Mudança.

Nenhum político escapa das críticas dos foliões da Mudança, o prefeito é o alvo preferido

Histórico


Há controvérsias quanto o batismo do nome do “bloco”. Uma das possíveis explicações é esta:

“Uma prostituta hostilizada pelos vizinhos do bairro resolve se mudar do local. Porém escolhe a segunda-feira de Carnaval para realizar a mudança. Ela veste sua melhor roupa, aluga uma carroça tão bem enfeitada como a mesma e parte com seus pertences pela rua principal do bairro Fazenda Garcia, bem perto do Centro de Salvador, despertando a atenção de moradores e foliões que se preparavam para curtir o Carnaval. Esse fato, com os devidos acréscimos dados ao longo da historia, é uma das origens possíveis da Mudança do Garcia, uma das mais tradicionais manifestações populares do Carnaval de Salvador.”, conta André Santana.

O que mais chama atenção na Mudança é a diversidade de público, o grito de guerra dos sindicalistas, a alegria das dreags queens e homossexuais e a festa da criançada nas carroças coloridas.


 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
                                                                                         
O clima alegre da Mudança contagia as crianças

Jegue polêmico


Atendendo reivindicações das entidades ambientalistas Terra Verde Vida e Célula Mãe e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o promotor de Justiça da 2ª Vara do Meio Ambiente, Heron Gordilho, promoveu uma reunião com os organizadores da Mudança este ano.

Em reunião no Ministério Público da Bahia, os representantes do tradicional desfile, se comprometeram a não usar mais carroças puxadas por animais, o que será proibido a partir de 2011. Na Bahia muitas manifestações religiosas como a famosa Lavagem da Igreja do Bonfim e cívicas como o desfile da Independência da Bahia no dia 2 de julho, contam com carroças ornamentadas puxadas a cavalos e jegues. Como ficará esta tradição?

Com a restrição, a preocupação é que o único bloco de protesto, considerado um patrimônio do carnaval baiano, entre em decadência.

“Este ano não vai ter figura de destaque, isopor, nada. Nem cavalo nem nada. Não foi só o Ministério Público, não! Estava um monte de gente lá... OAB, ambientalistas... Batemos na tecla da tradição, mas eles alegaram que a tradição não pode prejudicar os animais” diz Lorito, um dos organizadores da Mudança.

Questionado se a festa não se tornará careta, por radicalismos de ambientalistas, Lorito lamenta a proibição, mas diz que lei é lei. “Eles alegam que só os animais estarem no meio de tanta gente, o som, o batuque, isso estressa. E o calor... Não pude falar nada. Fui constatado pelo veterinário: o animal ouve 20 vezes mais do que a gente. Vou dizer que não? Já vi os caras das Muquiranas (bloco de travestidos) pegarem nos testículos do cavalo. E uma mulher deu "uma tapa" no animal... Essas coisas acontecem.”

E os reflexos da medida no histórico cortejo? “Não acho que a Mudança vai acabar, mas ela se descaracteriza. Fica bonita de carroça! A gente vai ter que colocar a Mudança à altura dela. Estamos contando com todo mundo pra solucionar esse problema”, relata Lorito. Acredito que até a retirada das carroças do desfile muita polêmica vai rolar.

Acabei de chegar da Mudança. Achei o desfile menos contundente nas críticas ao cenário político local e nacional do que em outros anos. Enfim, a festa segue

Foto: Vagner Magalhães/ Terra
O jegue, folião de muitos carnavais agora ficará fora da avenida.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 




          no seu ritmo plural, com espaço para todas as tribos, até quarta-feira de tarde.  
 
Claudia Correia, assistente social, jornalista, profª da ESSUCSal, mestre em Planejamento Urbano.

3 comentários:

  1. O texto em torno da Mudança do Garcia está showwwwwwwwww e explica muito bem a não cobertura pela grande mídia... Também vindo de Claudia já era de se esperar tal prodição. Adooooorei. BJS WILTON MERCÊS

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  2. Viva a Mudanda! Parabens ao blog e à autora do texto. Realmente, não dá pra entender essa neura repressiva de nossa Sociedade e instituições. "Proibido proibir", lembremos. Proibir menos e criar mais. Os jegues e cavalos "humanizam" as festas urbanas. Lamentavelmente alguns companheiros ambientalistas, procuradores e juízes não percebem isso. Que tal ao invés de proibir negociar com os organizadores da Mudança uma troca de horários ou mesmo percurso, etc, enfim, soluções (acho que sempre possíveis) para superação dos problemas de exposição indevida dos animais. Vale lembrar que em ínúmeros países há participação de animais em festas populares há milênios, sem grandes problemas.
    Abç, Eduardo Almeida

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  3. O que muda na Mudança? O que muda com a Mudança?Parece-me que gente também deveria ser preocupação de ambientalistas. Há algo sobre isso em discussão? Sobre as gentes que desfilam amontoadas dos dois lados das cordas dos blocos, ou mesmo as que deliram por sobre todas as gentes dos dois lados?! Ou será que o desejo passeia por uma Mudança muda? Só vc mesmo pra me fazer conhecer esse Carnaval.

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