Olá Pessoal!
Estou iniciando nesta data a minha editoria aqui no “Mídia e Questão Social”. Passamos um bom tempo discutindo qual seria o nome mais apropriado para dar conta da minha proposta e do meu tipo de escrita. De todos os nomes sugeridos, finalmente apareceu o escolhido: “O Efeito Quixote”! Mas o que seria esse tal “efeito”? Em minha humilde opinião, o Efeito Quixote é estranhar o conhecido e tornar familiar aquilo que não nos é próximo; é questionar o que já se encontra estabelecido; é buscar a utopia sem deixar de se reconhecer na realidade... Bom, ser “Quixote” no mundo moderno não é fácil, mas é extremamente importante! Então, se mais “Quixotes” e “Sanchos Panças” quiserem se juntar a nós nessa luta por um mundo diferente fiquem à vontade!
Hoje resolvi escrever um pouco sobre o tema ilustrado no título acima, por conta de uma lembrança que emergiu em minha mente quando estava assistindo a nonagésima reprise do filme “Guerra dos mundos”. Mais do que o roteiro do filme, sempre me chamou a atenção a estória por trás dele e é por ela que este texto se inicia.
Antes mesmo da primeira versão do filme (lançada em 1953), houve o livro lançado por H.G. Wells com a estória original e, nosso alvo na primeira parte deste texto, o programa de rádio que o consagrou em 1938. Neste programa, um Jovem Orson Welles trouxe o assombro e a maravilha a uma parcela da população norte-americana ao dramatizar a invasão alienígena a uma pequena cidade do país.
Exatamente no dia 30 de outubro de 1938, após argumentar bastante, Orson Welles conseguiu convencer a direção da emissora de rádio CBS (Columbia Broadcasting System) a levar ao ar uma versão do livro encenada em tempo real, em comemoração à tradicional festa norte-americana de halloween. Estima-se que aproximadamente 2 milhões de ouvintes estariam com os rádios ligados naquela noite e que muitas pessoas teriam realmente acreditado que os depoimentos e notícias de ataques eram verídicos. Os relatos sobre a reação da população à transmissão versam sobre a emergência de um pânico generalizado, agravado pelo medo da guerra que rondava a Europa. Linhas de emergência como as da polícia e bombeiros rapidamente foram congestionadas, pessoas fugiram de suas casas ou se esconderam em abrigos construídos para proteger de outro tipo de guerra... Algumas notícias não confirmadas falam também sobre agressões, saques e tentativas de suicídios...
Muito se pode refletir ao analisar o incidente: podemos dizer que naquela época o rádio era o principal meio de comunicação e a sua forma de transmissão, bem como a dificuldade de confirmação das informações, favoreceram a confusão entre a realidade e a ficção; podemos dizer que o talento e o senso de oportunidade de Orson Welles foram ímpares para o impacto da transmissão; que as pessoas eram mais inocentes (será?)...
Mas e hoje? Será que ainda se confundem ficção e realidade quando o assunto é a transmissão de notícias? Será que ainda engolimos “gato por lebre”, mesmo contando com recursos de transmissão em tempo real e com uma gama incrível de fontes de informação?
Parece que 62 anos depois do “guerra dos mundos” ainda temos que tomar muito cuidado com as notícias que recebemos e passamos adiante... Vários exemplos podem ser citados sem muito esforço, como o caso dos e-mails que tem circulado com notícias falsas sobre a morte de uma ou mais celebridades. Tais e-mails tem como função induzir seus leitores a teclar num link da internet para saber mais, dando a brecha para hackers invadirem seu computador, plantarem vírus ou mesmo roubarem senhas e informações importantes.
Outro exemplo interessante (e talvez mais fácil de lembrar) é o caso noticiado ano passado em que um garoto de seis anos teria alçado vôo acidentalmente, após se esconder em um balão de hélio. O caso mobilizou equipes de resgate e gerou comoção internacional. As câmeras de TV registraram cada momento do vôo do balão até a sua queda e a descoberta de que a criança não estava lá... Depois foi apurado que tudo não passava de um golpe midiático que os pais do menino deram com intuito de se promover para um reality show. No final, os pais do garoto foram julgados e condenados a pagar os custos da operação de resgate, bem como a um período de prisão.
Ainda podemos acrescentar à lista o vídeo divulgado através da internet, onde uma mulher afirmava ter contaminado com o vírus HIV mais de 500 homens. A velocidade na transmissão de notícias proporcionada pelo meio utilizado para sua divulgação fez com que o vídeo fosse rapidamente conhecido no mundo todo. Depois de um tempo, foi exposto que o vídeo havia sido feito por uma atriz que teria a intenção de chamar a atenção para a prática de sexo seguro. Se era uma jogada de cunho “educativo” ou meramente uma forma de se promover, ninguém sabe... Mas que realmente o artifício de noticiar essa estória “ficcional” trouxe mais uma vez à cena a discussão sobre as questões envolvendo a prevenção referente à transmissão do vírus HIV e demais doenças sexualmente transmissíveis.
Analisando um pouco os exemplos citados, chegamos à seguinte questão: o aumento da tecnologia e das fontes de informação por si só não é garantia de que uma notícia divulgada seja uma verdade absoluta e incontestável.
Se no exemplo da “guerra dos mundos” o que se observa é uma população que se assusta com a dramatização radiofônica de uma invasão alienígena, nos exemplos mais recentes observamos que o aumento dos canais de comunicação, quando norteado pela necessidade de ser o primeiro a noticiar ou mesmo o que tem a maior capacidade de “impactar”, não se constitui em uma defesa frente a possibilidade da divulgação de uma informação equivocada ou mesmo manipulada que venha a engrupir a população.
Ás vezes uma meia verdade noticiada, pode ter conseqüências tão desastrosas quanto uma mentira (vide a forma como a mídia hegemônica tem retratado a questão dos direitos humanos e apoiado massivamente sua desconstrução através de medidas como a redução da idade penal e a criminalização de movimentos sociais).
Por isso, é necessário não nos atermos a informações de uma única fonte, bem como buscarmos também compreender em qual contexto uma informação é divulgada e qual seu impacto junto ao público que a recebe.
Bom, por hoje é só...
Retorno aos “meus moinhos” e continuo na batalha das idéias...
Até a próxima!
Leandro Rocha
Leandro Rocha é assistente social, pós-graduado em Psicologia Jurídica pela UCAM, integrante da Comissão de Comunicação e Cultura do CRESS-RJ.
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Informações complementares:
Sobre Welles:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Orson_welles
Notícias falsas:
http://www.brainstorm9.com.br/2007/06/11/noticia-falsa-sobre-asteroide-para-divulgar-citroe/
http://www.infomaniaco.com.br/noticias/noticia-falsa-sobre-vo-447-usada-para-roubar-senhas-bancrias/
http://portalimprensa.com.br/portal/ultimas_noticias/2009/10/19/imprensa31531.shtml
http://www.sidneyrezende.com/noticia/60680+caso+do+menino+que+voou+em+balao+de+helio+foi+uma+farsa+diz+xerife
http://terratv.terra.com.br/Especiais/Hits-da-Web/4412-266971/Mulher-diz-que-passou-virus-HIV-a-500-homens.htm?template=246
Querido Léo Quixote,
ResponderExcluirParabéns pela estréia. Seu artigo está muito bom e, nos chama a atenção para uma questão muito importante, o múltiplo olhar que temos que ter com a notícia. Uma dica de primeira é sobre a informação dada. Temos de buscar mais de uma fonte de informação, para que assim, a gente conheça as múltiplas ideologias e as "várias" verdades, muitas vezes noticiadas. Show , Léo!!
Penso, que os ventos dos moinhos lhe trarão muitas e muitas inspirações e um olhar visionário. Sucesso, amigo.
Um forte abraço.
Léo querido,
ResponderExcluirVou "Quixotar" nos parabéns, pois a Nel jà "falou e disse". Então quero saudà-lo com poesia, da mais fina, a de Adélia Prado, para fazer côro e eco com o "efeito utopia", que teimamos em querer fazer virar realidade:
"Ninguém se cansa de bondade e avencas.
Os rebanhos guardados guardam o homem.
Todos que estamos vivos morreremos.
Não é para entender que (...) pensamos,
é para sermos perdoados".
(do livro BAGAGEM)
Grande abraço e manda a ver nas "avencas e nos moinhos", Mione*
Olá, Leandro!
ResponderExcluirHá cerca de uma semana, graças ao informativo do CRESS-MG, tomei conhecimento do livro "Mídia, Questão Social e Serviço Social".
Para uma pessoa que possui formação em Serviço Social e que sempre teve muito interesse pelo assunto "mídia", uma grata surpresa!
Evidentemente, não resisti a encomendar o meu exemplar.
Logo, acabei encontrando também o blog. E hoje, passando por aqui, achei o seu post e, já de cara, me identifiquei com o nome da Editoria.
De fato, não é fácil manter o "quixotismo" nos dias de hoje. Confesso quase ter abandonado o meu, por diversas vezes. Mas ainda tento preservá-lo. "Seja o que for, seja por amor às causas perdidas..." como já cantou o Gessinger.
Mas vamos ao tema do post, né? rs
Propícia a discussão!
Quando o assunto é "notícia", não abro mão do meu "jeito mineiro desconfiado de ser" mesmo! rs
E, há tempos, deixei de me balizar na TV e no impresso. Aliás, hoje em dia, minha fonte de informações é basicamente a Web, pela diversidade, amplitude, praticidade, enfim...
Mas tenho plena consciência de que nem tudo são flores. Muita coisa precisa ser filtrada antes de "consumida". E, mesmo filtrando, ainda corremos esse risco de engolir gato por lebre.
Daí, a pergunta que sempre fica: até que ponto estamos mesmo preparados para lidar com esse "de tudo" que a internet nos oferece?
É um grande desafio...
E que se torna ainda maior quando levamos em conta a questão da universalidade do acesso. Embora tenhamos avançado no que diz respeito à inclusão digital, é fato que ainda temos muito que caminhar para que a rede esteja realmente ao alcance de todos.
Eis, então, o duplo desafio de se pensar a democratização do acesso à informação.
Bom, acho que acabei me empolgando! rs
É um assunto que rende muitas discussões.
Fiquei, de fato, entusiasmada por saber da existência de uma efetiva "discussão midiática" dentro do Serviço Social.
Parabéns a todos vocês pela iniciativa do projeto!
Um abraço!
Olá pessoal!
ResponderExcluirIndo por partes:
1) Nelma, obrigado por suas palavras sempre sábias e gentis! Há um ditado (árabe, se não me engano)que diz o seguinte: "existem 3 tipos de verdade: a sua, a minha e a verdadeira". Sem a pretensão de ser o "dono da verdade" o objetivo é chamar a atenção pra existência de várias versões e pontos de vista. Sabendo distinguí-los fica muito mais difícil de ser pego nas "cascas de bananas" que aparecem pelo caminho.
2) Mione, Adélia Prado é uma poetisa de primeira grandeza e citada por você então..rs Sigamos com nossa utopia, pois a utopia de muitos tem mais proximidade com a concretização de uma realidade do que a de uma pessoa só.
3) Olá Luara! Que bom que você tem achado interessantes nossas discussões! Sinta-se a vontade pra participar e se "empolgar" quando puder e quiser! Concordo com você quando lembra que tão importante quanto a busca por informação de qualidade é o direito ao acesso à essas informações, que tem sido negado ainda à grande parcela da população. Mas não desistamos! Uma hora os moinhos caem...
Abraços a todas!
Leandro Rocha