quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Editoria Estranha Semelhança com a Utopia


Uma estranha semelhança com a utopia


A tecnologia avançou, mas a filosofia não, nem o amor nem a maneira
pela qual os humanos organizam e regulam suas relações com outros.
(Eric Hobsbawm, 2009)

Jefferson Ruiz


Escrever para leitura pública é sempre um desafio. Como diz o Intervozes (2009), sempre que comunicamos algo para grandes públicos “editamos” informação. Em outras palavras, escolhemos o que dizer, o que não dizer, o que priorizar, o que secundarizar. E a vida, como nos lembram vários filósofos e autores que debatem ética, é feita de escolhas. A grande maioria delas está condicionada pelo mundo em que vivemos: o mesmo vídeo do Intervozes destaca que liberdade é um conceito que precisa ser pensado a partir das condições básicas que são oferecidas para seu exercício. Mas também somos responsáveis por determinadas escolhas que fazemos e é passível que sejamos cobrados por elas.

Ao ser convidado pelos companheiros que mantêm o blog “midiaequestaosocial” a escrever periodicamente para este instrumento de comunicação tive um certo desconforto e um “frio na barriga”. Não sou dos maiores internautas. Ainda leio muito em papel, embora passe cada vez mais tempo de minha vida diante de computadores. Entendo perfeitamente atrasos em respostas a e-mails, desconhecimento de informações que estão no primeiro “clic” em qualquer página bastante acessada da internet etc. Dificilmente leio textos do tamanho que este terá sem imprimi-los... Enfim, alguém com estas características teria que se desafiar a um novo comportamento frente, no mínimo, ao próprio blog... Outra responsabilidade calava alto: o “midiaequestaosocial” é resultado de um processo coletivo de assistentes sociais, profissionais de comunicação e outros sujeitos que resultou em livro publicado pela Cortez em 2009. Tive a honra de ser um de seus organizadores, gentilmente convidado por Mione Sales. Então, como “arredar pé” deste desafio?

Decidida a participação, negociei que ela começaria uma vez encerrado o ano e minha graduação em Serviço Social, na UFRJ. Aí foi buscar o título desta editoria e esboçar-lhe um perfil que conferisse algum nível de contribuição e interesse aos que nos honrarem com sua leitura, comentários, divergências, ideias, debates. Assim chegamos ao título da editoria. Ele foi “pinçado” de uma frase do filósofo francês Jean Paul Sartre. Segundo Santos (2003: 14), ele afirmou, certa vez, que uma ideia, antes de ser concretizada, tem estranha semelhança com a utopia. A frase é genial! Em tempos em que tenta se afirmar que as ideologias estariam superadas, que o fim da história – com a crise das sociedades ditas socialistas – é uma realidade, pensar projetos que tenham estranhas semelhanças com a utopia pareceu-me oferecer uma lufada de oxigênio em momentos de dificuldade intensa de respiração (já fui asmático, sei bem o que é isso...).

Desafio a postos, a tarefa passou a ser pensar que contribuição eu poderia ter para as reflexões provocadas pelo blog. Minha intenção é combinar temas com os quais me preocupo teoricamente a tarefas e reflexões quotidianas em textos que ousem contribuir para a reflexão dos visitantes do blog. Nesta perspectiva, o que se pode esperar desta editoria são papos sobre a relação entre direitos, comunicação, conjuntura e a sociedade justa para cuja construção almejamos contribuir. Penso em cumprir esta desafiadora tarefa a partir das leituras que faço da mídia diária e, eventualmente, da mídia alternativa. Elas são parte das tarefas de assessoria política que hoje cumpro no Conselho Regional de Serviço Social do Rio de Janeiro. Dados estatísticos e um diálogo com a (ainda pequena) cobertura sobre determinadas políticas públicas e/ou sociais também serão eixos importantes. Quando possível e necessário, podem surgir reflexões respeitosas sobre a relação disto tudo com o Serviço Social. No que se refere aos direitos humanos, antecipo minha impressão de que o debate sobre este tema persiste mal feito entre vários setores que se reivindicam de esquerda. A preocupação em contribuir com tais reflexões foi o centro de minha monografia e será objeto de pesquisa no mestrado.

A ideia é que minha contribuição circule por aí: socializar informações a que eu tenha acesso em meu exercício profissional e em minhas pesquisas; expor idéias ao questionamento dos que se dispuserem a ler os textos; tentar dialogar com as utopias que temos que persistir buscando tornar realidade. Procurarei deixar as referências e sugestões de leituras, vídeos, textos, debates e outras que possam contribuir para estes desafios. Dentre eles está um a que este blog já vem respondendo: precisamos ver a comunicação como um direito que não pode (assim como as riquezas e o acesso aos demais direitos), em uma sociedade justa, estar concentrado nas mãos de poucos em detrimento das grandes maiorias. Em princípio quinzenalmente deixarei um novo texto. Eventualmente este prazo será reduzido, para não perder a atualidade dos temas que a conjuntura provocar. Na próxima semana já deve surgir o texto inicial.

O tamanho deste desafio faz com que meus dedos digitem estas orações e se cocem: há ou não a tal estranha semelhança de que fala Sartre?

SOBRE AS CITAÇÕES:

A frase de Hobsbawm foi retirada da instigante entrevista concedida no último sábado ao jornal O Globo (Caderno Prosa & Verso, página 6, edição de 26/12/2009), sob o título “Voz da razão”. Aos 92 anos, o historiador marxista britânico continua demonstrando sua lucidez e seu estilo provocativo. A matéria anuncia o relançamento no Brasil de seus três livros sobre “o longo século XIX” (A era das revoluções, A era do capital e A era dos impérios). Para quem estiver no Rio de Janeiro posso socializar cópia da entrevista.

O vídeo do Intervozes pode ser encontrado aqui mesmo no blog “midiaequestaosocial”, em texto produzido pela colega Nelma no dia 24 de novembro de 2009. Também é possível encontrá-lo no sítio eletrônico www.direitoacomunicacao.org.br . Sua divulgação, citada a fonte, é permitida e incentivada. Ele tem apenas 17 minutos e faz um apanhado criativo, engraçado e interessante do debate sobre o direito à comunicação no Brasil. De nossa parte já o apresentamos, com sucesso, em recente evento da comissão de comunicação do Conselho Regional de Serviço Social do Rio de Janeiro.

O livro Mídia, questão social e Serviço Social foi lançado em setembro pela Editora Cortez. Pode ser encontrado em suas distribuidoras ou acessando páginas de livrarias que comercializam livros pela internet (inclusive a da própria Editora Cortez). A referência bibliográfica: SALES, Mione Apolinário & RUIZ, Jefferson Lee de Souza (orgs.). Mídia, questão social e Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2009.

A frase de Sartre dará título à editoria. Ela foi retirada de um pequeno artigo de Boaventura Sousa Santos, em que discute a possibilidade de os direitos humanos serem um “guião emancipatório” na sociedade atual. O autor afirma que a concepção marxista de direitos humanos, no âmbito das concepções ocidentais, como aquela que deve ser adotada para um mais adequado trato deste debate. A referência bibliográfica: SANTOS, Boaventura Sousa. Por uma concepção multicultural de direitos humanos. In: SANTOS, Boaventura Sousa. Os caminhos e o cosmopolitismo multicultural. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

Jefferson Lee de Souza Ruiz, Bacharel em Serviço Social, Mestrando em Serviço Social na UFRJ, Assessor Político do Conselho Regional de Serviço Social do Rio de Janeiro - CRESS-7ª R. Contato: leenorio@yahoo.com.br

4 comentários:

  1. Um beijão, Jeff, de parabéns!!! Seja muito bem-vindo! Vamos adorar ler você e suas opiniões inquietas, mas sempre muito produtivas e consequentes. Mione*

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  2. Jeff, faço coro com a Mi: "seja bem-vindo!"
    O "Centopéia Coletivo" (batismo da Mi)agradece a sua chegada. Teremos mais um acréscimo, que por sinal será muito importante, para esse trabalho, o qual todos nós fazemos com satisfação e parceria.
    Um beijão!!
    Nelma.

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  3. Lee, parabéns! Achei muito interessante, com certeza vou participar. Beijos

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  4. Seja bem vindo, Jeff!

    Pelo texto inicial já dá pra salivar aguardando as próximas contribuições!

    Abraços!

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