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sábado, 9 de fevereiro de 2013

Editoria Web@Tecno

NAS RUAS, O EXÍLIO DOS INCONSCIENTES:

 Será possível "forçar portas, inventar saídas"?!



Museu do Insconciente: Obra de Davi Pereira da Silva 
Sem título - Outubro 2000 Óleo sobre eucatex 55 x 71 cm


"O osso da fala dos loucos têm lírios"
Manoel de Barros


Nelma Espíndola*


O seu codinome era Coronel, seguido da alcunha de "Fura Poço".  A imagem desse homem com quem convivi num certo período de minha adolescência me veio à mente. As lembranças me chegaram, num misto de saudade, ponteada de tristeza e enternecimento.

Um velho negro, andarilho das ruas de meu bairro àquela época. Um ser social simbólico, que fazia dos seus delírios uma afirmação de existência. Vivia a sua história personificada de “coronel”, cujo uniforme militar, se compunha de um casaco azul, calça comprida, botas e um quepe, ganho de alguém que alimentava o seu devaneio. Nada simbolizava um uniforme autêntico. O visível em suas vestimentas era só o desgaste feito em cada peça, com o tempo.  No peito de seu casaco, muitas fitas amarradas com medalhas e latas penduradas. Nunca vi nenhum familiar dele.  Sua casa por vezes era  nas calçadas ou na praça.

Hoje, percebo, que de fato, eu, meus amigos e todos os que o ajudavam, de algum modo, se constituíam em membros de sua família, mesmo que para ele e para nós, naquele dado momento essa representação social nunca tenha se clarificado.  Talvez esse sentimento seja a manifestação da impotência e ignorância, repensados hoje. Esse resgate de culpa, consequência da omissão na luta concreta de se fazer valer os seus direitos e a proteção social, que lhe garantissem o atendimento digno e respeitoso à sua saúde mental.